A atriz argentina Thelma Fardin levou quase seis anos para que a Justiça acreditasse que foi vítima de abuso sexual quando era menor de idade. Um tribunal brasileiro de segunda instância condenou nesta segunda-feira o ator Juan Darthes a seis anos de prisão por violar Fardin na Nicarágua em 2009, no final da turnê de uma série juvenil em que ambos participavam. Ela tinha 16 anos; ele, 45. “Eu tinha perdido a fé na Justiça”, disse Fardin à beira das lágrimas logo após conhecer a sentença que reverteu a absolvição do ano passado por um tribunal inferior.
“Esta sentença deve ser uma mensagem de esperança para todas as pessoas que ainda estão sofrendo algum tipo de abuso. Deve ser uma esperança para que, mesmo que pensem que é muito difícil, que a pessoa a quem devem denunciar é muito poderosa e tem muitas ferramentas, há uma possibilidade de reparação”, enfatizou Fardin em uma coletiva de imprensa em Buenos Aires. “Apesar de hoje o meu caso ter obtido justiça, não é a realidade da maioria dos casos”, advertiu. A atriz argentina contou com amplo apoio ao longo do processo judicial, incluindo o da organização Anistia Internacional. Ela também contou com a colaboração dos ministérios públicos de três países – Nicarágua, Argentina e Brasil – para que o processo seguisse em frente.
Darthes foi condenado por maioria, por dois votos a um. O ator não será preso porque a sentença ainda não é definitiva e ele pode recorrer a uma instância superior.
A sentença marca uma mudança de paradigma ao focar no papel de poder que Darthes tinha sobre Fardin e envia uma mensagem clara: a justiça deve ouvir as vítimas. “Todos sabemos que os crimes dessa natureza ocorrem na solidão, então o testemunho da vítima tem uma importância muito grande. Por isso, o resultado é reparador”, afirmou um dos advogados de Fardin, Martín Arias Duval. “Acredito que isso nos dá uma luz de esperança de que, felizmente, começamos a quebrar estereótipos e práticas que têm a ver com um modo de pensamento que só revitimiza a vítima uma e outra vez”, opinou.
O caso de Fardin marcou um ponto de virada na luta contra a violência de gênero na Argentina. Darthes é um ator muito popular no país latino-americano e durante mais de 20 anos desempenhou papéis de galã e de pai de família. Outras três atrizes o haviam acusado publicamente antes – Calu Rivero, Natalia Juncos e Ana Coacci – mas poucos acreditaram nelas. O dia em que Fardin quebrou o silêncio apoiada por dezenas de colegas foi diferente. Seu relato vívido da violação desencadeou uma onda de solidariedade sem precedentes e as chamadas para a linha contra abuso sexual na infância aumentaram em 1.240%.
“Recebi muitos ataques”, lembrou Fardin nesta segunda-feira. “Me disseram que eu estava fazendo isso por fama, e não passa pela minha cabeça quem poderia inventar um fato assim para ganhar fama. Disseram que eu estava tentando obter algum benefício. Mas somos milhões e fomos milhões os que dissemos: ‘Não nos calamos mais'”, alertou.
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