Conversar com Oscar Tubío é como ter a chave de acesso a um mundo maravilhoso no qual se misturam as maiores figuras do esporte e da alta sociedade argentina das décadas de 70, 80 e 90. Este homem, que afirma que apenas sua audácia e as casualidades da vida o levaram por um caminho de sonho e sucesso, é também o criador dos dois maiores ícones de design e marketing de Boca Juniors e River Plate: as quatro estrelas com as letras CABJ (eternizadas por Diego Maradona em 1981) e o Leão emergindo do Monumental, que rugiu tão alto que levou o River Plate a vencer sua primeira Copa Libertadores e sua única Copa do Mundo em 1986.
Amigo de Carlos Reutemann, irmão de vida de Carlos Monzón (com quem nasceu seu famoso Bulldog, que muito depois foi utilizado por José Luis Chilavert) e pioneiro na estampagem de camisetas em seu famoso local popular localizado nas Galerías Jardín, a conversa com Oscar Tubío mostra também uma outra época em relação aos laços humanos: os códigos, a ética e o valor da palavra sobre todas as coisas.
– Quando surge a ideia de fazer aquelas quatro estrelas para a camisa do Boca?
– Eu conhecia Alberto J. Armando, que era o presidente do Boca. E propus a ele que a equipe jogasse a final Intercontinental contra o Borussia com uma camisa diferente, com metade em azul e a outra em amarelo, e expliquei que iria criar um ícone que identificasse o Boca, assim como a Ferrari tinha o Cavallino Rampante. E como Armando era um empresário do mundo automotivo, ele pegou minha ideia imediatamente e disse: “Eu amo, siga em frente”. Fanático por automobilismo e em referência à comparação com o ícone da Ferrari, ele acrescentou: “Essas quatro estrelas serão o Cavallino Rampante do Boca”. E foram. Mas não foi por causa daquele jogo, porque naquela camisa as estrelas eram azuis e estavam na parte amarela e ninguém as viu. Foi por causa de Maradona.
– O que aconteceu com aquelas camisas de 78?
– Eram de piqué e encolhiam quando eram lavadas. Foram usadas novamente contra o América do México, pela Copa Interamericana, mas não estavam mais em boas condições e nem eu nem o clube tínhamos dinheiro para fazer um novo jogo. Por isso lá é usada a tradicional azul e amarela.
– Como você conheceu Maradona?
– Quando diziam que Diego estava assinando com o River (mentira, porque ele queria ir para o Boca), Pepe Parada disse a ele: “Se você quiser jogar no Boca ou no River, tem que ser amigo de Oscar Tubío”. Um dia seu agente, Jorge Cyterszpiler, me liga e me convida para um café de trabalho. Nos encontramos ele, Diego e eu, e me dizem: “Temos quatro versões suas, Oscar. Alguns dizem que você é um bastardo, outros dizem que você é um cara muito legal, outros disseram que você é um gênio e outros disseram que você é um idiota. Qual é a sua explicação?”. Eu disse que os quatro estavam certos e expliquei: “O que lhe disse que sou um bastardo está perfeito, porque ele deve ser terrível. E eu com esses sou pior que eles. O que lhe disse que eu sou um cara muito legal, deve ser mais legal que o Quaker, e com as pessoas legais sou tão legal quanto eles. O que lhe disse que sou um gênio, certamente me pediu algo e fiz exatamente como ele queria. Então, para ele sou um gênio. E o que lhe disse que sou um idiota também está certo. Porque isso me explicou a Toto Lorenzo. Um dia estava com ele no vestiário do Boca e ele me disse: ‘Você é muito jovem, mas é brilhante, idiota. Eu te escuto falar e sinto que vende o que quiser a quem você quiser. Mas você não deve mostrar, você deve agir como um idiota. Estou lhe dizendo porque gosto de você. Sempre pareça idiota porque os negócios importantes são oferecidos aos idiotas para depois serem enganados. Então o que você tem que fazer é agir como um idiota, ouvir tudo o que lhe oferecem e quando encontrar um bom negócio, mergulhe nele e mostre a parte brilhante que você tem. Eu, Cyterszpiler e Diego rimos por uma hora. E ali nasceu a amizade.
– Como as estrelas retornaram em 1981?
– Depois daquela final na Alemanha sugeri a Armando que fizesse um acordo com a Adidas para vestir o Boca. Isso foi concretizado em 1980. Um ano depois, quando ocorreu a fusão entre Diego e o clube mais popular da Argentina, era para quebrar tudo em termos de marketing e venda de camisas. Quando não se sabia se ele assinaria com o River ou com o Boca, eu estava no escritório com Diego e também estava Adrián Paenza. Em um momento nós saímos e entra Aragón Cabrera, presidente do River, que queria levá-lo para jogar lá. Quando ele saiu irritado, Diego me chamou de volta. Ele pulava em cima de uma poltrona como uma criança, comemorando que não havia acordo com Aragón Cabrera e que iria para o Boca: “Ligue para Altunian (que era o tesoureiro do Boca), ligue para Altunian, que eu assino com o Boca agora mesmo”. O Boca não tinha dinheiro. “Faz algo”, me disse. E ele assinou. Quando lhe deram a camisa que ele usaria no Boca, ele não gostou e disse: “Não, não. Esta camisa deve ser desenhada por Oscar Tubío. Quero as quatro estrelas de 78”. Então Altunian me ligou, que na época era vocal, e disse: “Diego exige que você desenhe a camisa do Boca”.
– Mas não era da Adidas?
– Claro. E além disso, eu era muito amigo de Eduardo Bakchellian, um armênio que era um fenômeno e era o responsável pela Adidas em nosso país, porque naquele momento a Adidas Argentina estava nas mãos da Gatic S.A. e ele era seu presidente. Todos o conheciam como Don Eduardo. Quando, no meio dos anos 90, a Gatic quebrou, tudo passou para a Adidas Internacional e nunca mais foi o mesmo.
– Como prosseguiu aquele pedido de Diego?
– A Corigliano disse que não tinha problemas em fazer a camisa, mas respeitando o que a Adidas estava fazendo, porque eu e Bakchellian tínhamos uma relação de mútuo respeito e admiração profissional. Naquela época eu já fazia jaquetas para o Loco Gatti. No dia seguinte me ligaram e disseram que haviam conversado com Don Eduardo e ele havia dado o ok para que eu desenhasse a camisa e a Gatic S.A. a produzisse.
– O que Diego disse quando soube?
– Ele estava feliz. Ele me chamou para o escritório, me mostrou a camisa original que tinham mandado para ele e disse: “Veja isso. É horrível. Não tem identidade. E também não gosto desses números feitos pelas três listras. Ninguém os vê”. Bem, eu disse a ele que colocaria as estrelas de cor amarela na parte azul da camisa, o que ele gostou muito. E em relação aos números, disse que iria viajar para os EUA buscar alguns números de futebol americano (sou um fanático por esses números e os de hóquei no gelo porque sempre são legíveis), mas levaria algum tempo até voltar de viagem, então nas primeiras partidas usamos aqueles feitos pelas três listras. E trouxe mil números brancos e mil negros, que pouco depois foi usado pelo River.
– Como era a montagem daquela camisa do Boca em 1981?
– A Gatic S.A. produzia as camisas com base no meu design e as trazia para o meu local nas Galerías Jardín. Lá minhas funcionárias colocavam o ícone das estrelas, o número do futebol americano e se certificavam de que tudo estava correto. Quando todas estavam prontas, elas carregavam no meu carro, eu ia às sextas-feiras para La Candela e as entregava ao Cacho Gonzalez, o roupeiro.
– Alguma história com Diego que você possa compartilhar?
– Milhares. Mas vou te contar uma que descreve o quão rápido ele era e sempre foi para os amigos e para os negócios. Uns dias antes do Boca jogar com o Racing (empatando por 1 a 1 e se consagrando), cheguei à La Candela e Silvio Marzolini, que gostava muito de mim e tinha laços com a Adidas, me levou ao vestiário e disse: “Não desça ainda as camisas estampadas porque tem gente de El Gráfico e os fotógrafos vêm fazer o pôster para a revista do campeão. E a foto tem que ser sem as estrelas, porque na Adidas dizem que as estrelas ofuscaram o logotipo da marca. Aceitei sem problemas porque tinha um relacionamento ótimo com Eduardo. E então salta Diego e diz: “De jeito nenhum, Oscar. Esse design eu pedi a você”. Eu peço para ele não arrumar confusão com a Adidas por algo que ninguém notaria, mas ele insistiu nisso: abriu uma bolsa e tirou duas camisas com as estrelas, porque ele recebia 10 por partida e tinha do domingo anterior. E então ele diz: “Eu saio no pôster com as estrelas. Pernía estava ao lado dele e pediu a outra dele. E eles saem com meu design e o resto do time com a camisa do Boca sem estrelas. Eu não pude acreditar. Sempre que vejo aquele pôster me emociono.
– Como surgiu a ideia do Leão para o River?
– Quando Hugo Santilli assume como presidente, ele me chama e me diz que queria “um ícone” para o clube. Minha resposta foi: “Não venha com o tema do chapéu e do bastão por causa do Millonarios, porque isso qualquer garoto fã do River no colégio faz; eu vou criar um ícone que seja eterno”.
– Então?
– Fui ao jornal Clarín ver Caloi, que era fã do River e eu o conhecia através do meu sogro, o grande desenhista Hugo Pratt. E comentei minha ideia de retirar a faixa atrás da camisa, colocar os números em vermelho e criar um ícone que ajudasse a tirar o apelido de Galinha. Algo bastante poderoso. Comentei que quando era pequeno ia ver Boca contra o River no Monumental (quando o estádio ainda tinha a forma de ferradura), e eu estava na torcida visitante, de onde dava para ver o Rio da Prata e o rio tinha cor de leão. “Você tem que me desenhar um leão! Mas invente como desenhar o estádio ferradura, assim eu depois explico a história”, disse a Caloi. Ele adorou a ideia.
– Por que dizem que aquele logo é de Caloi?
– Porque foi desenhado por Caloi! Se eu não sei desenhar, não sou desenhista. Eu fui vê-lo e ele pegou a ideia de imediato. E assim nasceu o Leão com a faixa vermelha e a ferradura.
– Como era o design daquela camisa do River em 1981?
– A Gatic S.A. produzia as camisas com base no meu design e as trazia para o meu local nas Galerías Jardín. Lá minhas funcionárias colocavam o ícone dos leões, o número do futebol americano e se certificavam de que tudo estava correto. Quando todas estavam prontas, elas carregavam no meu carro, eu ia às sextas-feiras para La Candela e as entregava ao Cacho Gonzalez, o roupeiro.
– O que você sentiu quando em 2021 a Adidas relançou a camisa que o Boca usou em 1981?
– Foi estranho. Por um lado, um orgulho imenso, pois foi a confirmação de que o que eu havia criado era um ícone. Mas ao mesmo tempo, surpresa, porque fiquei sabendo que a Adidas já não era mais a Gatic S.A. Eles me ignoraram completamente, ignoraram meu trabalho e minha criação. O impacto do sucesso da camisa das estrelas com Diego foi enorme, e quando a Adidas fez o relançamento, usaram a imagem de Maradona, pois era a única que poderia fazer. Porque as estrelas lançadas em 78 não havia forma de discutir que eram minhas, porque a marca da camiseta era “O jardim de Oscar”; a camiseta era minha. Eu a entreguei, depois recomendei-a, pois ainda não existia merchandising no futebol, eu convenço Armando de que ele deveria fechar com a Adidas e lá ele acerta com a Gatic S.A. Depois da réplica de 81 fizeram a alternativa com número bicolor para falar da que foi usada na final Intercontinental de 78, que foi única e diferente, mas em nenhum momento tiveram a gentileza de dizer que a ideia e o design daquele número bicolor eram de Oscar Tubío. Nunca. A soberba da empresa internacional os cega.
– Você ainda está chateado?
– Pelas estrelas processei a Adidas a nível internacional, principalmente porque me doeu a falta de respeito quando sempre fiz as coisas de maneira correta. Imaginem que com um contrato assinado entre o Boca e a Adidas, em 1981 eu fazia o agasalho do Gatti e sempre colocava as três listras e o trifólio por minha excelente relação com o presidente da Gatic. Era uma época em que não havia contratos, não havia nada, mas você respeitava quem colocava o dinheiro e o valor da palavra. Muito tempo depois, Germán Burgos usou meu Bulldog em 96, eu fabricava aquela peça e colocava as três listras e o trifolio porque o River era vestido pela Adidas. Era o respeito que havia entre Oscar Tubío e Eduardo Bakchellian.
– O que foi decidido no fim das contas?
– Foram sete horas de interrogatório com os melhores advogados da Alemanha, os melhores de Nova York e os melhores da Califórnia. E eu, via Zoom. Em determinado momento, eles tentaram me diminuir dizendo que eu não podia registrar estrelas porque as estrelas já existem há séculos. E então me inspirei e disse: “Veja, a estrela de Mercedes-Benz é uma estrela especial. O Cavalo Esguio, da Ferrari, é um cavalo especial. São ícones. Nessa discussão estamos apenas por aquilo que você chama de quatro estrelas na camisa do Boca. E eu nunca desenhei estrelas. O que fiz foi superpor dois quadrados e a cada linha reta a tornar uma curvatura que faz surgir o desenho. Isso causa em você, em mim ou em qualquer pessoa uma ilusão óptica que faz parecer estrelas. Mas não existem estrelas de oito pontas, as estrelas têm cinco pontas. Então não sei por que você vê estrelas, mas eu sei que quando fiz esse design eu queria que você e todos vissem estrelas”. O renomado advogado ficou surpreso, a taquígrafa se divertiu e ali soube que eles não poderiam contra minha reivindicação.
– O assunto está encerrado?
– O julgamento já foi encerrado na Califórnia. Assinamos com a Adidas um contrato de confidencialidade no qual não posso falar sobre acordos financeiros. Mas eles não conseguiram provar que eu não sou o criador. Foi a vitória de Davi contra Golias. Agora vem a parte em que eles vão querer passar a bola para o Boca, que nada tem a ver com isso. Para a Justiça americana já ficou definido que o design das quatro estrelas é meu. E com a reedição feita em 2021 não foram vendidas 40.000 camisetas, foram vendidas cerca de quatro milhões de camisas do Boca no mundo. E quero saber se o Boca recebeu as royalties correspondentes por essa quantidade de peças e vou seguir, vou realmente seguir porque meu desejo é que não usem mais os clubes argentinos. Porque os brasileiros são muito bem pagos, mas a Argentina é muito pouco paga pelo que vendem mundialmente. Aquela camiseta do Boca de 81 foi declarada na Inglaterra como a segunda no ranking de designs mais bonitos da história do futebol mundial, atrás apenas daquela usada pela seleção dinamar