A situação de Florencia Marco, a empregada do clube de futebol que denunciou por abuso sexual ao dirigente.

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Como continua a vida de uma pessoa que, depois de ter sido vítima de abuso sexual por um colega de trabalho (no ambiente de trabalho) e ter tomado a forte decisão de denunciá-lo à Justiça, que por sua vez condenou o acusado, vê como outro juiz determina a “falta de mérito” em uma nova investigação que busca determinar se houve ou não falsos testemunhos de outros funcionários para encobrir o crime?

Florencia Marco é a funcionária do Boca que, em 7 de março de 2023, há dois anos, decidiu se apresentar à Justiça para denunciar Jorge Martínez, então técnico do time feminino profissional do Boca, por abuso sexual.

Cascini, Bermúdez e Delgado, membros do Conselho de futebol, foram acusados de falso testemunho e encobrimento no caso que condenou Jorge Martínez por abuso sexual, mas o juiz Marcelo Iturralde lhes concedeu a falta de mérito. Enquanto duas novas causas avançam na Justiça por falso testemunho e encobrimento de abuso sexual contra Jorge Bermúdez, Raúl Cascini, Marcelo Delgado (membros do Conselho de Futebol) e Adriana Bravo (então vice-presidente do clube e máxima responsável pelo Departamento de Gênero), a realidade da funcionária do clube azul e ouro é dramática.

“No meio desse vai e vem judicial, fui obrigada a voltar ao clube em dezembro passado. Me disseram que minha licença sem vencimento estava acabando e, como não querem concordar com a rescisão, tive que voltar ao trabalho”, relata Florencia Marco à LA NACIÓN.

De acordo com o clube, o retorno de Marco ao seu posto de trabalho era o passo necessário após o fim de um primeiro licenciamento com vencimento e um segundo licenciamento sem remuneração, e que ninguém a obrigou, mas era o que correspondia fazer do ponto de vista trabalhista.

A desconfortabilidade foi total para todos. Marco descreve: “A primeira coisa que fiz foi pedir para falar com o presidente do clube, mas foi impossível. E diante das negativas repetidas, fui citada pelo secretário geral, Ricardo Rosica. Quando cheguei à sala de reuniões, para minha grande surpresa percebi que o secretário geral, Ricardo Rosica, não estava sozinho, mas acompanhado pelo gerente geral, Sebastián Echeverría; o gerente de Recursos Humanos, Sergio Biancardi; a chefe de Recursos Humanos, Yanina Abrahan, e um advogado, Marcelo Mamianetti. Mais uma vez fui revitimizada, me fazendo sentir que não estava em um lugar seguro para voltar a trabalhar. E com a possibilidade de me encontrar nos corredores com Adriana Bravo, exatamente a pessoa que nos colocou em perigo por não saber como executar corretamente o protocolo e que está sendo investigada pela Justiça por encobrimento”.

Andrea Lucangioli, advogada de Marco, acrescenta: “Eles não promovem uma cultura de respeito, equidade de gênero e proteção dos direitos humanos para proteger as mulheres da violência e da violência no trabalho. Apostam no desgaste, para que Florencia se quebre e não tenha outra alternativa a não ser renunciar, perdendo mais de 13 anos de trabalho no Boca sem nenhum conflito. Colocam a vítima em uma posição de culpada”.

Em dezembro passado, o Boca informou a Florencia Marco que sua licença sem remuneração havia expirado e a intimou a retornar ao seu posto de trabalho no clube.

No dia 10 de abril de 2024, o juiz Dr. Sergio Adrián Paduczak, do Tribunal Oral em Crimes e Correcionais Nº 22 da Capital Federal, condenou Jorge Daniel Martínez a um ano de prisão, com suspensão da pena, e custas processuais, por considerá-lo autor do crime de abuso sexual. Além disso, o juiz, a pedido do promotor Martínez Burgos, extraiu os depoimentos de Marcelo Delgado e Jorge Bermúdez e os enviou ao Juiz designado para investigar a possibilidade de falso testemunho por parte deles. O magistrado afirmou na sentença: “É evidente que mentiram, não apenas pelo que Florencia Marco afirmou, mas também pelo restante dos registros do caso. É inconcebível a forma como se expressaram na audiência, dizendo que souberam apenas pelos meios de comunicação. Essa afirmação cai por terra quando se comprovou que tomaram conhecimento através do Departamento de Gênero do Boca, antes de a denúncia penal se tornar pública. Também pelas reuniões que foram realizadas entre diferentes membros da comissão técnica, o próprio técnico, a denunciante e outras autoridades do clube”.

Diante dessa sentença, duas novas causas se iniciam. A causa por falso testemunho contra Jorge Bermúdez e Marcelo Delgado é conduzida pela Promotoria Nacional Criminal e Correcional Número 3, a cargo de Dr. Marcelo Roma. Essa causa investiga o que foi dito pelos membros do Conselho de Futebol do Boca no julgamento em que Jorge Martínez foi condenado por abuso sexual. Paralelamente, uma investigação foi aberta por encobrimento sexual dos membros do Conselho de Futebol, Cascini, Delgado, Bermúdez, e Adriana Bravo, diretora, na Promotoria Nacional Criminal e Correcional Nº 22, a cargo de Dr. Marcelo Martínez Burgos.

Nesta quinta-feira, após dois meses e meio de interrogatórios aos acusados, Marcelo Iturralde, o novo juiz que assumiu o caso desde 2025, concedeu a falta de mérito a Bermúdez, Cascini e Delgado. Isso significa que eles continuarão sendo investigados, mas ficaram mais distantes de um processo e um eventual julgamento, o que parecia iminente com o magistrado anterior, Carlos Bruniard.

Em uma decisão de 37 páginas, o juiz alega um critério restritivo sobre o encobrimento ao considerar as provas testemunhais de forma favorável à defesa. O magistrado determinou que, para configuração do encobrimento, era necessário que se tivesse impedido que Marco prestasse a denúncia judicial, o que não ocorreu. Além disso, ele ressaltou que não se verificou a desaparição de meios de prova que tornassem inviável a denúncia.

Por outro lado, no aspecto probatório, a sentença destaca que as testemunhas que prestaram depoimento negaram ter conhecimento de pressões para evitar a denúncia de Marco. Esse ponto foi crucial para o magistrado descartar a hipótese de encobrimento, ao considerar que não havia elementos suficientes que comprovassem manobras destinadas a travar o avanço do caso.

Essa decisão surpreendeu a promotoria de Marcelo Roma, que atua nesse processo e avalia se apresentará um recurso ou continuará reunindo provas para que o juiz reconsidere essa decisão e investigue a fundo a suposta culpa dos membros do Conselho de Futebol e da ex-vice-presidente do clube.

Em conversa com este jornal, a Dra. Lucangioli, advogada de Marco, analisou a sentença: “Acho curioso que o juiz substituto Mariano Iturralde tenha emitido a decisão de falta de mérito sem levar em consideração as árduas investigações realizadas pelos promotores Marcelo Martínez Burgos e Marcelo Roma, tampouco as declarações do juiz Sergio Paduczak na sentença do julgamento em que Jorge Martínez foi condenado. Muito menos os relatos e provas apresentados pela vítima. Vale ressaltar que Raúl Cascini, defendido por Fernando Burlando, e Marcelo Delgado se recusaram a prestar depoimento”.

Os assessores legais do Club Atlético Boca Juniors, ao serem consultados pela LA NACIÓN, afirmaram: “Consideramos que a decisão do juiz é razoável. Houve vários meses de trabalho, onde todas as provas foram avaliadas e todas as partes ouvidas. Todos deram suas explicações, todos apresentaram suas provas e o magistrado chegou a uma conclusão que, a nosso ver, está de acordo com a lei”.

Enquanto aguarda a decisão da Câmara sobre o recurso que a promotoria que investiga o caso apresentará nos próximos dias, Florencia mantém-se confiante: “Por conta do critério de um juiz que apoia os pactos de poder, liderados pelo presidente de um dos clubes mais importantes do país, não perderei a fé na Justiça. Continuo confiando na séria investigação dos promotores e nas resoluções comprometidas dos juízes.”

Alex Barsa

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