Independente quis ganhar por obrigação e Racing esteve perto por sabedoria: o 1-1 deixou o clássico em paz

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Sentir-se por alguns meses o melhor do bairro, ou da cidade no caso de Avellaneda, é um dos muitos traços de masculinidade brutal que mantém sua validade para além da saudável incorporação da mulher ao futebol, e não é um assunto menor. A tentação de se mostrar mais poderoso que o vizinho costuma gerar, pelo menos na Argentina, um nível de tensão exagerado, superior ao de qualquer outro jogo e nem sempre fácil de digerir para protagonistas e torcedores.

Independiente e Racing ofereceram um novo capítulo da série que poderia ser escrita sobre o valor da psicologia e do controle da tensão ambiental no esporte. Com seu bom desempenho no campeonato e sua longa série de jogos sem perder em casa, o Rojo acrescentou uma “desculpa” extra na hora de encarar o clássico: a necessidade de gritar um desafio diante das recentes taças conquistadas por seu rival, como se para deixar claro que pelo menos nesse aspecto sua supremacia continuava intacta. As arquibancadas montaram uma festa descomunal antes do início da partida, mas a equipe teria dificuldade em transferi-la para o campo.

A Academia vive uma realidade diferente. Sabe-se mais nestes tempos, não tem urgências, e embora uma vitória no Bochini significasse uma provocação daquelas que não se esquecem, não havia em seu caso uma ordem de vitória imperiosa e o empate final de 1 a 1 acabou sendo muito mais satisfatório para o visitante do que para o dono da casa.

A disparidade de atitude mental se fez presente desde o início da partida. Havia no campo uma equipe firme e tranquila, vestida de celeste e branco, que lidava com a recepção hostil sem grandes esforços; e outra perturbada pela obrigação tácita que vinha das arquibancadas, muitas vezes com gritos, minutos a fio, atormentada pelo silêncio que fecha as gargantas.

O Rojo jogou um primeiro tempo disperso posicionalmente, preso no aspecto ofensivo e mais errático do que o habitual individualmente. Tentou encurralar o Racing com cruzamentos dos lados, e fez com que Marco Di Césare e especialmente Nazareno Colombo crescessem, ganhando cada bola que caía pelo ar. Tentou jogar por baixo e encontrou a teia que Santiago Sosa, Juan Nardoni, Agustín Almendra, Santiago Solari e os dois laterais criavam. Ficou tonto ao ver que o planejado não dava certo e foi aumentando o volume de seus erros.

A equipe de Gustavo Costas surpreendeu com a posição de Santiago Sosa, que atuou como volante central, dedicado a marcar – e anular – Lautaro Millán, permitindo a Nardoni se destacar, vencendo cada duelo físico e contagiando seus companheiros para aproveitar o desequilíbrio emocional do mandante e ficar com cada bola dividida. Assim, o gol de Gastón Martirena aos 20 minutos chegou, após um esforço de Nardoni nos arredores da área, que passou pela esquerda e acabou nos pés do uruguaio quase por acaso. Dessa forma, ele foi marcando as diferenças de qualidade a seu favor, como Ricardo Bochini havia destacado na prévia. O anfitrião assustava apenas com seus cruzamentos, o visitante dominava o meio-campo, e ameaçava a cada contra-ataque.

Nessas circunstâncias, Independiente tem um trunfo. Rodrigo Rey, que completou cem jogos consecutivos no clube, impediu Maxi Salas de marcar e também Sosa antes do intervalo, dando a sua equipe uma vida extra que saberia aproveitar no segundo tempo.

Assim como os comandados por Julio Vaccari ficaram atordoados por um longo período com a desvantagem, aos torcedores custou reagir ao golpe. Os de fora se reorganizaram e recuperaram as forças no intervalo; no banco, o técnico reagiu. Os cânticos voltaram e Luciano Cabral pisou no gramado, sem dúvida o jogador mais lúcido e talentoso do elenco do Rojo.

A suplência do número 10 nos jogos que prometem ser mais físicos do que bem jogados promete ser um tema de debate constante no Independiente. Cabral pede, se destaca, põe a bola sob a sola e pensa. É verdade que perde quando confrontado em lutas físicas e nem sempre executa com igual precisão, mas ele dá ao jogo o toque de inventividade e clareza que seus companheiros não conseguem, apesar do empenho de jogadores como Santiago Montiel ou Millan.

Guiado por Cabral, com o fervor que vinha das arquibancadas, e ajudado pela fadiga física e pelas mudanças feitas por Gustavo Costas, o Rojo foi apertando o Racing cada vez mais ao redor de sua área e começou a rondar a igualdade que conseguiu em uma jogada elaborada por seus dois melhores jogadores – Cabral e Angulo – e na qual Di Césare e Gabriel Arias falharam ao mesmo tempo. A fé do colombiano se infiltrou entre os dois e, com um toque suave de cabeça, empatou o jogo.

Independiente sempre queria mais. Antes do apito inicial de Nicolás Ramírez e no quarto de hora após o empate. Não teve o equilíbrio psicológico imprescindível nos 45 minutos iniciais, nem a precisão necessária para perfurar a densa defesa blanquiceleste no final. O empate serviu pelo menos para manter a liderança na zona B.

O empate deixou um sabor melhor para a Academia. Não melhora sua posição na tabela de classificação e prolonga sua série sem vitórias, mas dadas as circunstâncias físicas com as quais chegou ao clássico, foi o suficiente para impedir a festa que seu vizinho havia previsto.

O bairro, ou melhor, a cidade, terá que esperar pelo segundo semestre para conhecer seu líder em 2025.

Alex Barsa

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