Javier Milei busca minar as relações bilaterais com Brasil e Bolívia

  • Tempo de leitura:6 minutos de leitura

O presidente da Argentina, Javier Milei, continua a dinamitar as relações com seus vizinhos. Já fez isso com o colombiano Gustavo Petro. Agora escalou em sua briga pessoal com seus pares do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Bolívia, Luis Arce. Ao primeiro ele chamou de “corrupto” e “comunista” há algum tempo. Lula da Silva exigiu um pedido de desculpas por dizer “bobagens” e o ultra direitista respondeu ausentando-se da cúpula de presidentes do Mercosul que será realizada em Assunção na próxima segunda-feira. Para deixar claro que não tem intenções de concórdia, ele viajará durante o fim de semana para o Brasil para participar de um evento da extrema direita brasileira ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro, inimigo declarado de Lula. A Arce, por sua vez, ele acusou de divulgar uma “falsa denúncia de golpe de Estado” pela revolta militar da quarta-feira passada, e de liderar um “governo socialista” que coloca “em perigo a democracia boliviana”.

Em pouco mais de seis meses de governo, Milei realizou sete viagens ao exterior, um recorde para um presidente argentino. Mas nenhuma delas foi uma visita de Estado ou incluiu países relevantes para as relações bilaterais. O ultradireitista até rompeu com a tradição de fazer como presidente a primeira viagem do mandato ao Brasil, país que integra o Mercosul junto com a Argentina.

Na chancelaria brasileira preferem não alimentar a briga pessoal entre Milei e Lula. Não consideram um gesto de desdém o fato do argentino não estar em Assunção com seus colegas do Mercosul e destacam que até agora, a má relação entre os presidentes não afetou o funcionamento do bloco. Embora Lula e Milei não se falem, também não deram instruções para que as equipes de trabalho de ambos os países não o façam. As relações bilaterais têm força suficiente para suportar um período em que não haja um bom diálogo presidencial, existem áreas em que as coisas avançam por conta própria.

Apesar dos insultos de Milei contra Lula, o argentino cuidou para que, logo após vencer as eleições, sua atual chanceler, Diana Mondino, fosse a Brasília para acalmar as águas diplomáticas. Posteriormente, retornou em visita oficial. Quando o governo de Lula pediu informações ao país vizinho sobre bolsonaristas foragidos da justiça, a Argentina enviou as informações em poucos dias. Em resposta, em menos de 24 horas foi resolvido um problema de pagamento de um carregamento de gás que o Brasil enviou com urgência para a Argentina para evitar cortes de suprimento em meio a uma onda de frio inesperada.

As tensões atuais entre os chefes de Estado de ambos os países são mais intensas do que as protagonizadas por Bolsonaro e Fernández, também antagonistas ideológicos, mas aquela não foi uma relação fluida. O ex-militar brasileiro não parabenizou seu homólogo argentino quando este venceu as eleições em 2019 e deram o primeiro aperto de mão em um G20. Mas como boa parte de seus mandatos coincidiram com a pandemia e o confinamento, foi menos evidente que a relação entre os presidentes era conflituosa.

Agora, antes da cúpula do Mercosul em Assunção, o clã Bolsonaro organizou para o próximo fim de semana a convenção anual da extrema direita brasileira. E, segundo revelou Eduardo Bolsonaro, deputado e elo da família com o restante da internacional populista de extrema direita, Milei estará pessoalmente para uma conferência e uma reunião bilateral com Jair Bolsonaro. Também está prevista a participação do chileno José Antonio Kast, um ex-candidato presidencial, junto com os principais deputados bolsonaristas.

O encontro ultradireitista acontece sob o guarda-chuva da Conferência Política de Ação Conservadora (CPAC), uma organização americana que promove cúpulas entre os principais líderes internacionais da direita mais radical. Este domingo também é uma data marcante para a ultradireita mundial porque a França realizará o segundo turno das legislativas e as pesquisas indicam que o partido de Marine Le Pen, vencedor do primeiro turno, pode obter a maioria absoluta.

A convenção brasileira será realizada em Balneário Camboriú, uma cidade litorânea do estado de Santa Catarina, no Brasil mais bolsonarista.

A ausência de Milei na cúpula do Mercosul e sua presença em Camboriú um dia antes estão em sintonia com a doutrina ultra para as relações exteriores. Milei vê um mundo de líderes, heróis e empreendedores que se saem bem apesar do Estado colocar obstáculos. Por isso, não se importa em encontrar líderes amigos de outro país e não ver os presidentes. Isso não lhe incomoda e ele constrói sua própria rede transnacional com libertários de todo o mundo. Esse manuseio heterodoxo também se aplica ao Brasil, em parte alimentado pela percepção de que ambos os países perderam relevância mútua. Em um cenário em que o Brasil se propunha a ser um líder regional, ter a Argentina na mesa era importante. Mas não é tão importante quando, como hoje, ele se propõe a ser um líder mais global. Os interesses compartilhados diminuíram mesmo antes de Milei e o Brasil depende menos da Argentina. Há uma degradação da relação onde os gestos de Milei têm cada vez menos importância.

O secretário de Relações Internacionais do Pro, partido do ex-presidente Mauricio Macri, Fulvio Pompeo, opina que, apesar de tudo, o ultradireitista não tomou uma boa decisão ao se ausentar da cúpula do Mercosul. “É uma oportunidade perdida para a Argentina e para Milei. Ele poderia expressar sua visão perante os colegas da região. Até mesmo para questionar o quão fechado e paralisado o Mercosul está”.

Bolívia até agora tinha escapado das acusações de Milei. Mas neste domingo, a Casa Rosada divulgou um comunicado do Gabinete da Presidência, onde dava como verdadeira a versão de que em La Paz houve um “autogolpe” perpetrado por Arce, conforme promovido pela direita boliviana e também pelo ex-presidente Evo Morales. O governo do Movimento ao Socialismo (MAS) respondeu chamando seu embaixador em Buenos Aires, Ramiro Tapia, para consultas, e pedindo explicações ao argentino credenciado em La Paz, Marcelo Adrián Massoni. A chanceler boliviana, María Nela Prada, considerou “inamistosas e temerárias” as declarações da Casa Rosada.

A responsabilidade de recolher os cacos que o presidente espalha mais uma vez é do Ministro das Relações Exteriores de Milei, Diana Mondino. De seu escritório, foi adiantado que, por enquanto, não há planos para retaliação da Bolívia.

Alex Barsa

Apaixonado por tecnologia, inovações e viagens. Compartilho minhas experiências, dicas e roteiros para ajudar na sua viagem. Junte-se a mim e prepare-se para se encantar com paisagens deslumbrantes, cultura vibrante e culinária deliciosa!