Motosserras e tratores avançam sobre o segundo pulmão verde da América do Sul

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Os bosques do Gran Chaco são o segundo pulmão verde da América do Sul, depois da Amazônia. Lá, a derrubada e o desmatamento avançam sem parar. Durante o primeiro semestre deste ano, a parte argentina do ecossistema sofreu a desflorestação de 59.557 hectares, uma área equivalente a três vezes a superfície da Cidade de Buenos Aires. O avanço da fronteira agrícola — especialmente para a criação de gado e o cultivo de soja, para exportação — afeta mais as províncias do Chaco e Santiago del Estero, e ocorre principalmente de forma ilegal, graças à falta de perseguição e penalização das infrações. No caso do Chaco, também intervêm outros fatores: a recente flexibilização da regulamentação que protege as florestas e, conforme denunciado perante a Justiça pela Associação de Advogados Ambientais, a cumplicidade entre funcionários e empresários do setor agroindustrial — que, muitas vezes, são as mesmas pessoas.

A região do Gran Chaco se estende em parte dos territórios da Argentina, Brasil, Bolívia e Paraguai. Abriga cerca de 3.400 espécies de plantas, 500 de aves, 150 de mamíferos, 120 de répteis e 100 de anfíbios. A destruição desse ecossistema florestal está acelerando, pelo menos em sua área argentina. Até o momento deste ano, o estrago das máquinas e das motosserras foi 15% superior ao registrado no primeiro semestre de 2023, quando foram desmatados 51.600 hectares, detalhou a Greenpeace. De acordo com as estimativas da organização, entre janeiro e junho passados a desflorestação atingiu 27.148 hectares na província de Chaco; 21.047 hectares em Santiago del Estero; outros 7.162 hectares em Formosa e mais 4.200 em Salta.

“Entre 1998 e 2022, em toda a Argentina se perderam 7 milhões de hectares de florestas”, diz Hernán Giardini, coordenador da campanha de florestas da Greenpeace. 75% da desflorestação argentina se concentra na região do Chaco, detalha. “Em um contexto de crise climática, isso tem um impacto muito sério na biodiversidade. Há espécies que podem desaparecer. Neste momento, restam 20 exemplares de onça-pintada no Gran Chaco”, exemplifica. “A desflorestação provoca inundações e também secas. Um processo paralelo ao desmatamento é o despejo de comunidades de camponeses e povos indígenas, o que acaba gerando conflitos violentos.”

Para Giardini, há uma situação de emergência que “deveria levar os governos a proibir os desmatamentos em vez de promovê-los. O sistema de multas não é suficiente contra a ilegalidade, a penalização é necessária”. Hoje, explica, aos produtores agropecuários convém desflorestar irregularmente e ampliar a fronteira produtiva: com os lucros obtidos por exportações, pagam facilmente as multas vigentes.

Frente aos dados de desflorestação revelados pela Greenpeace, a Direção de Florestas do Chaco afirmou que o relatório do primeiro semestre inclui não apenas desmatamentos ilegais, mas também atividades autorizadas que cobrem cerca de 7.000 hectares. Também destacou que estão sendo tomadas medidas para controlar a desflorestação ilícita, incluindo a apreensão de máquinas.

“Ecocídio e exclusão”

As informações do Sistema Nacional de Monitorização das Florestas Nativas indicam que, das quase 7 milhões de hectares de florestas perdidas no último quarto de século na Argentina, mais de 800.000 hectares estão no Chaco, uma das 23 províncias do país. Nesse contexto, a legislatura provincial aprovou em abril passado — após um rápido processo que excluiu a participação da comunidade — uma atualização do Ordenamento Territorial de Florestas Nativas. A reforma amplia as áreas onde o desmatamento poderá ser autorizado, segundo denúncias de organizações ambientalistas como a Fundação Vida Silvestre, Greenpeace e o Coletivo Somos Monte Chaco. As entidades alertaram que serão afetadas áreas do Parque Nacional Copo e das reservas La Pirámide e Loro Hablador, entre outras.

“A inconstitucional lei votada é o produto final da ação repreensível de um grupo de funcionários, legisladores e empresários que, com diferentes papéis, perseguem o mesmo objetivo: projetar um plano para devastar a floresta nativa do Chaco e enriquecer ilicitamente”, afirma uma denúncia penal da Associação de Advogados Ambientais da Argentina. A apresentação, feita perante o Tribunal Federal do Chaco, frisa que o benefício buscado reside na “valorização monetária das terras reclassificadas, a expansão da fronteira agropecuária, o aproveitamento da mão de obra vulnerável praticamente reduzida a condições de servidão e a comercialização da madeira e seus subprodutos”.

A denúncia pede uma medida cautelar que suspenda os efeitos do novo ordenamento territorial e que pare toda atividade de destruição da floresta nativa. O cerne da acusação é a suposta “ação coordenada” de funcionários, legisladores e empresários, que passam alternadamente do setor privado para o setor público, e a quem são atribuídos os crimes de fraude, abuso de autoridade, tráfico de influências e negociações incompatíveis, entre outros.

A Associação de Advogados Ambientalistas analisou as licenças de desmatamento autorizadas pela província nos últimos anos e alertou que, em muitos casos, foram concedidas por funcionários que antes ou depois tiveram atividades empresariais em setores ligados à produção florestal ou agropecuária. Da mesma forma, a reforma do ordenamento territorial foi impulsionada por legisladores vinculados a esses mesmos setores produtivos. Trata-se de um problema reconhecido internacionalmente como as “portas giratórias” ou, também, “o lobo vigiando as galinhas”. Até o momento, o governo do Chaco, liderado pelo governador Leandro Zdero, optou por não responder às acusações.

“Não há país que tenha saído da pobreza com um modelo primário exportador de recursos naturais”, diz Enrique Viale, presidente da Associação de Advogados Ambientalistas. “O Chaco”, garante, “é a melhor demonstração de que este modelo colonial não funciona: é a área mais desmatada e uma das mais pobres do país. Há uma máfia se aproveitando do ecocídio e da exclusão social.”

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Alex Barsa

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