E ouvir o sétimo jogo desde o retorno da lenda, nasceu outro River. O River de Gallardo voltou. Algumas marcas, pelo menos. Algumas certezas. Um punhado de magia derramado sobre o Monumental, que viveu uma festa, na véspera dos confrontos de copa com o Colo Colo e o superclássico. Há vida: o 4 a 1 sobre o rochoso Atlético Tucumán, um dos animadores da Liga Profissional, convida a acreditar. As pessoas voltaram a acreditar.
A noite dos 27 chutes, dos 60% de posse de bola, de Bustos, um demônio pela direita e de Acuña, um campeão do mundo pela esquerda. Gols de todas as cores. Alguns deslizes defensivos, dúvidas no meio-campo, um 4-3-3 inicial inesperado: tudo isso também faz parte do reestruturado River de Muñeco. Colidio entrou e selou a goleada.
A noite teve um prólogo de inverno para a equipe milionária: perdeu aos 10 minutos. Franco Nicola, o camisa 10 do Decano, definiu com sutileza contra Armani, após uma série de erros defensivos, da esquerda para o centro da defesa. Todos tiveram responsabilidade e González Pírez ficou espalhado, como um símbolo. O primeiro chute a gol.
Uma curiosidade: se algo precisava ser resgatado do retorno de Gallardo ao Monumental, era a solidez defensiva, fornecida por dois novos nas laterais, Bustos e Acuña e a presença de Pezzella. Com Paulo Díaz descansando devido à dupla data das eliminatórias, González Pirez ficou muito exposto. Mas não foi o único.
River saiu do letargo com avanços sem brilho, sem conexão. Uma pirueta de Meza na área, por cima. Um chute de Nacho Fernández, defendido por Durso. Investidas audaciosas sem um contexto claro, sem um plano. Determinação, vontade. Gallardo, enquanto isso, mantinha as mãos nos bolsos e uma expressão de preocupação. Não era, até então (e como em grande parte dos jogos desde seu retorno), um time com a sua marca. Um time de autor.
Uma formação sem velocidade, previsível. Parecia que faltavam duas, talvez três marchas. A pré-temporada, no meio da data da FIFA, deveria ter sido para isso: para ajustar as cordas. Pressão alta, voracidade ofensiva, prepotência no círculo central, astúcia afiada na própria zona. Pouco, quase nada da sua essência. Até que…
Até que uma bola parada mudou tudo. Escanteio de Nacho Fernández (vontade de garoto, físico de veterano), investida de González Pirez, de cabeça ao solo. O 1 a 1 não transformou sua falha defensiva (será que sofreu por ser o segundo zagueiro?), mas o gol deu impulso ao Monumental. Cantou-se por River, pelo Muñeco, pela Libertadores.
E River recuperou uma pequena parte da essência histórica. O Diablito Echeverri se moveu para o centro, como um (falso) camisa 10, antes preso sem sentido na posição de ponta esquerda, em um inesperado 4-3-3, com Meza na outra fronteira.
Até que o gol, que foi comemorado dois minutos após ser marcado, assustou alguns fantasmas. River o comemorou com alma, vida e atraso. A jogada começou com um cruzamento de Bustos e Borja levou tudo. Cabeceio, trave, o goleiro no caminho e um rebote do artilheiro. Siga, siga, foi o sinal de Sebastián Zunino. No entanto, o VAR, tantas vezes questionado com razão, desta vez tomou nota. A bola entrou claramente. O colombiano alcançou os 50 gols em 95 jogos com a camisa do River.
Uma bicicleta do artilheiro, que o goleiro mandou para escanteio, foi o último aviso do primeiro tempo, de que o River estava vivo. Quase sem perceber, a equipe milionária estava perdendo e passou a ganhar, em um abrir e fechar de olhos, com o pesadelo de Tesuri nas costas dos volantes. O meio-campista do Atlético Tucumán joga cada dia mais solto.
Aplausos para o Muñeco, agora sim. A reta final deveria ser a confirmação de algumas pistas. No entanto, ele escapou antes dos dois minutos, com um chute de longe de Bajamich, que bateu na trave, a quilômetros do alcance de Armani. Talvez, esse golpe de sorte lhe deu mais força. E entre todos, a melhor versão. Acuña lançado: marcação, projeção, personalidade. Alguns cruzamentos precisos, vontade inabalável.
Soltando o Diablito, Bustos mais confiante, outro cabeceio de Pirez, que desta vez foi salvo por Durso. O estádio se levantou com os vestígios da nostalgia e algumas razões presentes.
As entradas de Lanzini e Colidio (o autor do último gol) deram outras ferramentas a Gallardo, mas o impulso sempre esteve pelo lado esquerdo. De uma jogada maravilhosa de Acuña, para o primeiro gol de Meza com comemoração pessoal inclusa. Agora sim, o River se soltou. Pelas laterais, principalmente. Os aplausos foram contínuos, nesse ponto. De cima para baixo. Do público, que cantava pelo Boca e pela copa, para o treinador, com outra expressão, mais primaveril, mais jovial. Até houve uma ovação para Acuña, o destaque, substituído no fim por um histórico, como Milton Casco. “O ovo, ovo”, marcou a agenda. Todo um recado.
A alma voltou ao corpo do Muñeco. O gigante acordou. E isso não é pouca coisa.