Ainda antes de aterrissar na Espanha, antes que Javier Milei abrisse a boca, a viagem do presidente argentino já estava envolvida em uma controvérsia em seu país. Desde que assumiu o cargo há cinco meses e 10 dias, Milei fez seis viagens ao exterior e na maioria delas não desenvolveu uma agenda de Estado nem manteve encontros com autoridades das nações visitadas, mas participou de atividades menos vinculadas aos interesses nacionais e mais aos seus particulares. Dirigentes da oposição questionam que, enquanto dentro do país prega que “não há dinheiro” e implementa um plano de severo ajuste do gasto público, com a motosserra como emblema, Milei e sua comitiva utilizam o avião presidencial e gastam às custas dos cofres públicos para promover ao redor do mundo a figura do líder ultradireitista.
A visita de Milei a Madri no último fim de semana havia sido confirmada pelo presidente argentino em 29 de março, quando anunciou em suas redes sociais que participaria da cúpula do Vox junto ao seu “querido amigo” Santiago Abascal, líder do partido ultra espanhol. Após os primeiros questionamentos sobre o caráter privado da viagem, o governo respondeu que Milei teria uma agenda oficial e que se reuniria com empresários na Espanha. Apenas 45 dias após o anúncio da viagem, na semana passada, foi possível confirmar a reunião e quem participaria.
Nos três primeiros viagens do presidente ao exterior, o governo argentino informou ter gasto um total de 168 milhões de pesos. Ainda não existem dados oficiais sobre as últimas três viagens. Nesse contexto, a oposição da Hacemos Coalición Federal solicitou informações ao governo para detalhar as razões das viagens de Milei “em uso de sua investidura” aos Estados Unidos, Suíça, Israel, Itália e Espanha. Pediram que fossem fornecidos itinerários, atividades, custos e origem dos fundos utilizados. “Queremos saber se foram visitas de Estado ou com agenda privada. Pelas postagens em redes sociais e pelos comentários do porta-voz, parece que são viagens de caráter privado em geral”, afirmou o deputado Óscar Agost Carreño, um dos signatários da solicitação de informações. Por sua vez, o deputado do Frente de Esquerda Gabriel Solano denunciou Milei à justiça “por usar fundos e bens públicos, incluindo o avião presidencial, para viajar à Espanha com o objetivo de participar de atividades do partido Vox. O custo para o Estado ultrapassará os 500.000 dólares”.
Em seus cinco meses e 10 dias como presidente, Milei fez cinco visitas a diferentes partes da Argentina, somadas aos passeios realizados no exterior. Em janeiro, foi à Suíça para participar do Fórum de Davos. Em fevereiro, viajou para Israel, Itália e Vaticano, onde realizou atividades de Estado. No final do mesmo mês, Milei fez sua primeira visita aos Estados Unidos: se encontrou com outro ícone da direita global, o ex-presidente Donald Trump, e depois falou na Conferência Política de Ação Conservadora (CPAC). Aos EUA viajou novamente em abril, para ser homenageado como “embaixador internacional da luz” pela organização judaica Jabad Lubavitch e, em seguida, para se reunir com o dono da Tesla, Elon Musk. Com o milionário de origem sul-africana se encontraria novamente no início de maio, em sua terceira visita aos Estados Unidos. Nessa ocasião, também discursou para empresários, banqueiros e representantes de fundos de investimento no Fórum do Instituto Milken.
As críticas pelo desperdício de fundos públicos tocam em um ponto sensível para o governo da La Libertad Avanza. Milei construiu grande parte de sua vitória eleitoral atacando os privilégios da “casta política” e agora é apontado por incorrer nas mesmas condutas que antes denegria. “Não são viagens privadas”, defendeu o porta-voz presidencial, Manuel Adorni. “Não fazemos nenhuma autocrítica em termos de gastos, porque posso assegurar que, se existe um governo austero e que gasta apenas o mínimo necessário, é este”, insistiu na semana passada.
